Cd graça braga - o samba de - martinho da vila - CANAL3

Discos de um compositor só, uma armadilha. Primeiro porque já se esgotam os principais nomes, dado que são poucos os que tenham uma obra verdadeiramente grande ao ponto de dela ser possível pinçar um punhado de canções sem que o disco caia na mesmice deslavada ou na irregularidade incômoda. Depois porque nem sempre a obra do compositor consegue se equilibrar entre uma diversidade que dê sabor ao disco e uma coerência estilística que lhe confira unidade. E, por último e principalmente, porque não é nada fácil encontrar a afinidade plena entre voz, letra e melodia. Gal cantou Ary e Caymmi Bethânia, Noel, Roberto e Vinicius. Quantos terão cantado em disco Cartola, Tom ou Chico Beth cantou Nelson Cavaquinho, Teresa Cristina, Paulinho faltava quem cantasse Martinho. E eis que o amplo arco do tempo que Martinho da Vila estende sobre um perímetro espacial que se amplia encontrou em Graça Braga seu veículo mais adequado. Martinho é mestre que fala de uma terra mítica, mística, mista e mestiça, meio campo, meio serra, meio avenida, meio terreiro, meio Rio, meio Beira, meio Luanda, meio quintal, meio calçada. Tem obra tão diversa quanto íntegra, fazendo parecer próximos lundu e kuduro, fazendo ter a sua cara tanto um samba de enredo quanto um partido alto, transformando em coerência estilística a discrepância que existe entre a saudade sensual de um ex-amor e o orgulho engajado da mulher brasileira. E, quando a obra de um compositor desse tipo e desse tamanho encontra a garganta certa o peito certo, o pulso certo, o prazer em ouvir é imenso, a felicidade é total, é comovente a sensação de que há salvação e conforto na mais genuína, simples e sofisticada musicalidade brasileira. Graça Braga cantando Martinho da Vila é disco que parece festa é como um pagode, uma roda, uma feijoada, um desfile. Esquenta, amorna, anima, comove, aproxima, apaixona, instiga, provoca, faz querer cantar, faz parar para ouvir. Vai do laraiá ao fraseado mais extenso, da onomatopeia percussiva ao melodioso linguajar intercala o surdo que ressoa por dentro com os sopros metálicos que brilham por fora. Tudo no passo rouco e na voz sacolejada dessa cantora grave que nasceu sambista. Vai, Graça, empresta a sua voz a essa obra tão necessária. Dá cor de terra, cobre, couro, madeira e feijão a esses sambas tão orgânicos, naturais e humanos. Toma para si para sempre uma ou outra música, dessas que nunca foram de ninguém ou que sempre foram de todos nós. Ensina a gente a cantar alguma coisa nova que a gente não conhecia, faz a gente lembrar de alguma coisa velha que nunca tinha esquecido. Mostra que o samba liberta e cativa nos faz livre para sermos felizes e nos prende ao amor, que é o melhor da vida.
Faixas

1 Samba dos Ancestrais
2 No Embalo da Vila
3 Fim de Reinado
4 Bandeira da Fé
5 Sonho de Um Sonho
6 Tom Maior
7 Plim Plim
8 Maré Mansa
9 Grande Amor
10 Danadinho Danado
11 Samba da Cacrocha Bamba
12 Nego Vem Sambar
13 É Hora de Pintar
14 Disritmia
15 Cidadã Brasileira
16 Onde o Brasil Aprendeu a Liberdade
17 Medley
a) Batuque na Cozinha
b) Balança Povo
c) Segure Tudo
d) Casa de Bamba